segunda-feira, 10 de fevereiro de 2025

Eichmann em Jerusalém – Um Relato Sobre a Banalidade do Mal


É sempre possível concordar ou discordar de uma narrativa, sem que isso nos faça demarcar ou rever em tudo, não nos deixando ir por ondas de arrasto. Deixo duas sugestões de leitura da filósofa alemã, Hannah Arendt. Dois textos no âmbito da filosofia política, com reflexões sobre o comportamento instrumentalizado do cidadão nos regimes totalitaristas. “As Origens do Totalitarismo”, um livro em que a autora analisa as origens históricas e os pontos comuns dos principais regimes totalitários do séc. XX. “Eichmann em Jerusalém – um relato sobre a banalidade do mal”, com base no julgamento de Adolf Eichmann, funcionário colaborador do regime nazi, responsável pela logística dos transportes de prisioneiros. Nestes textos, com os factos e reflexões que a autora reporta ao processo de Eichmann, em artigos para a revista “The New Yorker”, é abordado um dos mais mediáticos julgamentos de um colaborador do regime nazi. Segundo a autora, no decorrer do processo vai surgindo o rosto do " comum funcionário burocrata, não revelador do monstro sanguinário"; que todos esperavam ver. Aí é problematizada o conceito:"banalidade do mal";. Com a reflexão filosófica de base, Hannah Arendt analisa a possibilidade de um Estado igualar a violência, ao exercício comum do cumprimento de um papel burocrático. Questão que se torna o centro da obra, com os pontos de confluência das responsabilidades ética e legal, de um cidadão que, na sua defesa em tribunal, alegava ter praticado uma ação conforme a ordem legal vigente. Neste seu testemunho enraizado nos factos, com uma visão abrangente e de expectável controvérsia, a autora deixa-nos pano de fundo para uma reflexão mais séria sobre atos de violência que se escondem por trás de um cumprimento cego sob o jugo de uma autoridade. Um alerta para os perigos da massificação da opinião pública, como consequência da ausência de pensamento crítico. Um apelo à memória e responsabilidade coletivas, em relação ao que se vai tornando presente. Um cenário de esperança, também, num apelo implícito ao reforço de um sistema de ensino atento à formação de cidadãos esclarecidos, informados, interventivos e críticos. As obras trazem-nos uma realidade bem mais complexa do que o binómio bem/mal. Além disso, as nuances das cores com que se pinta parecem depender da forma como se consegue ver e analisar os factos, na busca de uma visão imparcial e crítica, com a consciência da complexidade das interações humanas e da responsabilidade moral do sujeito.

https://youtu.be/06jufTlnFbU?si=KjXrrX9Jl0NHAmU4

Paula Ribeiro
Docente de Filosofia
(Coordenadora do Departamento de Ciência Sociais e Humanas)

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